Esta poesia concreta de Augusto de Campos retrata que podemos mudar e transformar o que quisermos. Contudo, quando tentamos relacionar esta poesia ao ensino de Língua materna (Portuguesa) nos deparamos com a ausência de avanços no ensino que ainda utiliza as antigas e antiquadas concepções da gramática normativa. Para fins de definição, Possenti em seu livro “Por que (não) ensinar gramática nas escolas”, conceitua sobre a gramática normativa:
“... conjunto de regras que devem ser seguidas — é a mais conhecida do professor de primeiro e segundo graus, porque é em geral a definição que se adota nas gramáticas pedagógicas e nos livros didáticos. Com efeito, como se pode ler com bastante frequência nas apresentações feitas por seus autores, esses compêndios se destinam a fazer com que seus leitores aprendam a "falar e escrever corretamente"’’.
Essa gramática normativa é muito conhecida dos alunos e ex-alunos, principalmente nos ensinos de morfologia e sintaxe. Partiremos para as relexões sobre esses dois níveis da Linguística.
Morfologia é o estudo da estrutura, da formação e da classificação das palavras. O ensino de morfologia unificado está ao normativismo, levando o aluno à decoração de qual classe gramatical pertence tal palavra, sem nenhuma reflexão crítica sobre o seu funcionamento. Observe a situação abaixo como exemplo:
1 O verde está na moda.
2 Meu vestido é verde.
Em uma aula de morfologia, a professora utiliza o exemplo 2 (dois) para o estudo do adjetivo e fala:
- Verde é um adjetivo, pois qualifica o substantivo vestido.
Um aluno dessa professora faz a seguinte pergunta: - Professora, verde sempre será um adjetivo?
- Normalmente será – responde a professora.
Na avaliação de morfologia, a professora utiliza os dois exemplos citados em um exercício para dizer à qual classe gramatical pertencem as palavras grifadas. Logicamente, o aluno escreve na prova que a palavra verde nas duas frases é adjetivo. Na correção da avaliação, o aluno percebe que errou na classificação do exemplo 1 (um) e sem fazer nenhuma reflexão crítica, pergunta para a professora:
- Por que na frase “O verde está na moda”, verde não é um adjetivo?
- Pelo fato, que nesta frase, “verde” é um substantivo.
O aluno não entende a razão de que em um caso verde é um substantivo e em outro é um adjetivo.
Esta situação é comum entre os alunos, pois as aulas de morfologia são transformadas em aulas de decoração sem se fazer as reflexões que as palavras, principalmente as de inventário aberto, pode mudar sua classificação a partir do contexto em que são inseridas.
Perini em seu livro “Sofrendo a gramática”, no capítulo 5 “O adjetivo e o ornitorrinco (dilemas da classificação das palavras)”, retrata esse problema de classificação de palavras: semelhante ao Ornotorrinco (animal de difícil classificação por suas especifidades [animal mamífero que é um passáro que bota ovo]). Perini dá alguns exemplos:
(1) a. Uma palavra amiga (qualidade)
b. Um amigo fiel (nome de coisa)
(2) a. Uma menina magrela (qualidade)
b. Essa magrela (nome de coisa)
(3) a. Um homem trabalhador (qualidade)
b. Os trabalhadores (nome da coisa)
E podemos aumentar a lista:
(4) O diamante brilha na caverna (“brilha” é um verbo ou adjetivo?)
(5) A carne é fraca (“A” é um artigo defino no feminino ou um artigo indefinido feminino?)
(6) A altura das ondas impressionou o surfista (“altura” é um substantivo?)
Respostas:
(4) Brilha funciona, neste casa como um adjetivo, pois caracteriza o substantivo diamante.
(5) “A” neste caso é um artigo indefinido no feminino, pois não determina qual é a carne fraca.
(6) Altura está funcionando como um substantivo, pois é o sujeito da oração.
Sintaxe é o estudo da disposição das palavras, nas frases, nas orações e no discurso bem como a relação lógica que dão entre si. Antes de iniciarmos as reflexões sobre a sintaxe, cemeçemos com um fragmento do prefácio do livro “Práticas de Morfossintaxe – Como e por que aprender análise (morfo) sintática” de Inez Sautchuk:
Quando era professora de Língua Portuguesa, ainda no Ensino Fundamental e Médio, sempre havia, em sala de aula, momentos inevitáveis nos quais era iso “ensinar análise sintática”. Aos pucos, comecei a questionar a própria utilidade de um ensino mecânico e repetitivo, pautado por uma nomemclatura complicada e por uma sequência exaustiva de exercícios e mais exercícios em forma de orações “com termos grifados”. Sem que nenhum aluno me questionasse, passe a me perguntar o porquê de tudo aquilo.
Insatisfeita com a limitação dos próprios exercícios e com a redundância e a ineficienciência de “macetes” para encontrar o sujeito ou o objeto direto de uma oração, ou classificar este ou aquele verbo como transitivo ou intransitivo, compartilhava, secretamente, com a maioria de meus alunos, certa aversão por esse tipo de estudo.
Ao mesmo tempo, irritavam-me as constantes imperfeições com que os alunos se expressavam por escrito. Por que períodos tão confusos ou tão obscuros? Por que tanta incapacidade ou impossibilidade de se expressarem com clareza e eficiência em suas redações? Não lhes eram suficientes as tantas regras de gramática e as tantas aulas e exercícios de análise sintática que os vinham perseguindo por anos a fio?”SAUTCHUK (2010, pg. XV/ XVI).
Este trecho extraído do livro de Inez Sautchuk coaduna-se com a declaração de que o ensino da sintaxe está muito atrasado, com vários dogmas desnecessários e nomenclaturas complicada que tornam árduo o processo de aprendizagem. No ensino normativo de sintaxe é praticamente zero o número de alunos que aprendem sem ficar horas a fio decorando termos como: predicado, aposto, objeto direto, indireto, verbo transitivo, intransitivo, regência, orações subordinadas etc... , ou seja, o ensino da sintaxe se tornou apenas “decoração de termos e nomemclaturas” .
Nos últimos sessenta anos, a Línguistica avançou em seus estudos, propondo novas formas de estudos, inclusive na morfologia e na sintaxe:
Nível morfológico – aprimoramento dos estudos das classes de gramática a partir dos critérios morfológico, sintático e semântico.
Nível sintático – aprimoramento dos estudos a partir das teorias da Gramática Gerativa de Noam Chomksy. A Gramática Gerativa foi publicada na década de 1950.
O nosso intuito neste blog é estudar e trazer novos rumos para o ensino da morfossintaxe. Morfossintaxe é o estudo da palavra sob os níveis morfológicos (formação e classe gramatical à qual pertence) e os níveis sintáticos (função sintática que exerce na oração). Vamos aprimorar o conhecimento sobre morfossintaxe a partir do trecho do texto de Vânia Duarte, veiculado no site “Brasil escola”:
Na sua vida escolar você aprendeu (ou talvez ainda continue aprendendo) sobre os distintos fatos linguísticos, dentre eles: substantivo, adjetivo, sujeito, predicado, adjunto adverbial, etc. Contudo, é bem provável que não tenha aprendido como tais assuntos se dividem dentre as partes da gramática, tampouco acerca do que realmente seja morfossintaxe. Em razão disso, dispomo-nos a levar os conhecimentos necessários sobre um assunto de tamanha importância – muitas vezes cobrado em provas de concursos e exames de vestibulares.
Desta feita, a morfossintaxe nada mais é do que a análise morfológica e sintática, realizada simultaneamente. Mas para que sua compreensão seja efetivada de forma plausível, faz-se necessário entender, antes de tudo, que a análise morfológica diz respeito às dez classes gramaticais; e a análise sintática faz referência às funções desempenhada por uma dada palavra, estando ela inserida num contexto oracional”.
Referências:
PERINI, M. Sofrendo a Gramática - O adjetivo e o ornitorrinco (dilemas da classificação das palavras). São Paulo: Ática, 1997
POSSENTI, P. Por que (não) ensinar gramática. São Paulo: Mercado de Letras,2010
SAUTCHUK, I. Prática de Morfossintaxe: como e por que aprender análise (morfo) sintática - 2ª ed. São Paulo, Manole, 2010.
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